Desde
o dia 3 de janeiro, a região da Luz no centro de São Paulo, conhecida
como “cracolândia”, vem sendo palco de uma ostensiva ocupação militar
com quase 300 PMs, dos quais 152 são da Rota (tropa de elite), 12
bombeiros, helicóptero, 117 carros, 26 motos, 12 cães farejadores e 40
cavalos. O aparato de guerra tem abertamente o intuito de reprimir uma
população pobre, em parte consumidora de crack, majoritariamente formada
por moradores de rua ou pessoas em situação de rua.
A “guerra às drogas”, ou nesse caso mais
especificamente a “guerra ao crack” – como se fosse possível guerrear
contra uma substância e não contra pessoas – tem servido como pretexto
para os governos estadual de Geraldo Alckmin (PSDB) e municipal de
Gilberto Kassab (PSD) implementarem o processo violento de higienização e
criminalização da pobreza. A denominada Ação Integrada Centro Legal, ou
“Operação Sufoco”, orquestrada pela prefeitura com o governo do estado,
já conta com inúmeras denúncias de abuso de autoridade, racismo,
violação de direitos humanos e tortura, e infelizmente ainda não foi
questionada com veemência pelo governo federal.
Se a operação militar por si só já é
motivo para rechaço e indignação, por militarizar seletivamente questões
sociais e de saúde, os interesses por trás de sua sustentação são
capazes de piorar ainda mais o quadro. Pouco importa o que será dos que
ali vivem ou frequentam. Se existisse essa preocupação a abordagem não
só não seria policial e violenta, mas por meio de assistentes sociais e
agentes de saúde, como não poderia trazer como resultado a total
dispersão daqueles a quem supostamente se quereria alcançar. Se as
autoridades afirmam que o crack é questão de saúde pública, a prática
evidencia o contrário. Se publicamente alegam que a ação é para combater
o tráfico, fica visível que a repressão está voltada para o usuário,
atingindo no máximo o que se chama de “peixe pequeno” (vide a apreensão
de apenas meio quilo de crack), aquele que em grande maioria recorre ao
comércio ilegal para sustentar seu próprio consumo, e está longe do
estereótipo perigoso que a polícia usa para justificar sua violência.
A política de causar “dor e sofrimento”,
nas palavras do próprio coordenador de Políticas sobre Drogas do
governo, Luiz Alberto Chaves de Oliveira, tem o claro objetivo de
“limpar” aquelas pessoas dali de modo a abrir espaço para a
implementação do projeto Nova Luz, que prevê a demolição de um terço das
construções da região para a reconstrução e valorização do espaço com
vistas ao lucro da especulação imobiliária – financiadora esta dos
políticos que ocupam o poder.
A internação compulsória – dispositivo no
qual pessoas em condição de consumo de crack são internadas à força sob
ordem judicial em clínicas sem a menor regulamentação ou qualidade –
tampouco tem como objetivo o cuidado com as pessoas, já que pesquisas
patrocinadas pela ONU como apresentou o PROAD (Programa de Orientação e
Atendimento a Dependentes) indicam que a eficácia de internações contra a
vontade é de apenas 2%. Legitimadas pela demonização do crack e por um
imaginário social mais baseado em medo do que em informações
(estimuladas pela grande mídia e pelos discursos de nossos políticos),
medidas de terrorismo de Estado como essa vêm se tornando mais
frequentes, não por acaso à medida em que se aproximam a Copa do Mundo e
as Olimpíadas no Brasil.
O crack na região da Luz aparece como o
sintoma de um problema infinitamente maior. O consumo abusivo desta
droga nestes contextos não é a causa, mas sim a consequência de falta de
moradia, emprego, saúde, educação, enfim, condições dignas de vida às
quais todos temos direito.
Nesse sentido, nos articulamos no intuito
de denunciar e enfrentar a ação militar impetrada por nossos
governantes, e reivindicar condições dignas a todos aqueles que estão
marginalizados de seus direitos mínimos. No caso do uso problemático do
crack ou qualquer outra droga, defendemos um tratamento de saúde que
tenha como base a autonomia e o respeito ao indivíduo, com o
fortalecimento e ampliação da rede inter-setorial de atenção
psicossocial.
Janeiro de 2012.
Para assinar, envie email para luzlivre2012@gmail.comAssinam:
Ação dos Cristãos para a Abolição da Tortura (ACAT-Brasil)
Ação e Cidadania Planeta 21
Associação Brasileira de Saúde Mental (Abrasmesp)
Associação de Moradores e amigos da Santa Ifgênia e Luz (AMOALUZ)
Associação Pró Falsêmicos (Aprofe)
Associação Sem Teto da cidade de São Paulo (ASTC-SP)
Avoa núcleo artístico
Barricadas Abrem Caminhos
Bloco do Saci do Bixiga
Campo Debate Socialista
Cedeca Interlagos
Central de Movimentos Populares (CMP)
Centro de Convivência É de Lei
Centro Franciscano Chá do Padre (Sefras)
Centro Gaspar Garcia de Direitos Humanos
Ciranda Internacional de Comunicação Compartilhada
Coletivo Desentorpecendo A Razão (DAR)
Comitê para a Democratização da Informática – SP
Comitê Paulista pela Memória, Verdade e Justiça
Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana (CONDEPE-SP)
Conselho Regional de Psicologia (CRP) de São Paulo
Conselho Regional de Serviço Social do Estado de São Paulo
Contraponto
Espaço Cultural Latino-americano (ECLA)
Forum Regional de Defesa do Direito da Criança e do Adolescente – Sé
Frente Estadual Antimanicomial de São Paulo
Frente de Luta por Moradia (FLM)
Grupo de Estudos Pangiá Calógeras (GEPEC)
Instituto Cultural Lyndolpho Silva (ICLS)
Instituto Práxis de Direitos Humanos
Juventude Libre
Mandato Deputado Estadual Adriano Diogo (PT)
Mandato Deputado Estadual Carlos Giannazi (PSOL)
Mandato Deputado Federal Ivan Valente (PSOL)
Mandato Vereador Ítalo Cardoso (PT)
Marcha da Maconha – SP
Marcha Mundial das Mulheres
Militância em Ambientes Virtuais do PT – (MAUPTSP)
Movimento Água Branca
Movimento de Moradia da Região Central – MMRC
Movimento Nacional de Direitos Humanos (MNDH)
Movimento Passe Livre – MPL-SP
Movimento Sem Teto do Centro (MSTC)
NEILS (Núcleo de Ideologias e Lutas Sociais da PUC)
Núcleo de Direito à Cidade da Faculdade de Direito da USP
Núcleo de Estudos Interdisciplinares sobre Psicoativos (NEIP)
Ocupa Sampa
Promotora Legal Popular
PSOL-SP
Sindicato dos Guardas Civis de São Paulo – Sindguardas
União de Movimentos de Moradia – UMM-SP
Unidos Pra Lutar!
Nenhum comentário:
Postar um comentário