Tonico Benites, líder Guarani Kaiowá enviou esta Carta que estmos divulgando agora. A carta é um retrato contundente da violência sistemática que atinge os povos indígenas. Também é forte porque mostra o clamor contundentemente pacífico dos Guarani diante da iminência da perda de seu território sagrado. Não é de hoje, a violência contra os índios é tão antiga quanto a história do Brasil.
São ações combinadas que incluem a violência bruta traduzida em assassinatos de lideranças, cercos armados às terras indígenas imposto pelos empresários do agro-negócio com sentenças judiciais que desconsideram sistematicamente os direitos constitucionais dos povos indígenas. Leiam a carta com o coração aberto. Será possível sentir a atitude dos Guarani diante da violência. Contra as armas, o cerco, a possibilidade iminente do despejo violento imposto pelas forças policiais do Estado, rezam em seus rituais “para que eles (os brancos) compreendam a nossas vidas e nossas histórias antigas neste local”. Ensinam suas crianças e jovens a respeitar as terras cercadas pela monocultura da soja que destrói a biodiversidade da região em nome do “progresso e da civilização”.
De forma pacífica denunciam a nossa forma de construir civilização, que gera infelicidade, é escludente e cruel. Na floresta, no campo e na cidade. Não existe mais refúgio, esta carta nos diz claramente. Existe lugar para o modo de vida indígena no Brasil de hoje? É isto que os Guarani Kaiowa se perguntam e indagam das autoridades brasileiras. E não é qualquer terra que eles precisam para viver seu modo de vida. Precisam de Tekoha, lugar apropriado para se viver a cultura guarani. “O lugar pequeno antigo em que estamos morando hoje há ainda muitas plantas medicinais ao longo de rio e córrego, há ainda sapé para cobrir a casa, por isso acabamos de construir várias casas de sapé. Aqui estamos felizes com as criançadas, rezando todas as noites, educando diariamente para que não se envolvam nas violências adversas. Aqui não ameaçamos a vida de não-índios e nem corremos risco de ameaças dos não-índios, por isso nos sentimos bem integralmente nesse pequeno espaço de nossa antiga.”
Para os Guarani não é qualquer terra que se presta a viver a cultura. Precisa ser um lugar que Nhanderu deixou para os Guarani viverem o nhande reko, sua forma de vida que os prepara para a grande viagem cósmica rumo a Ywy Maraey, a Terra Sem Mal, que fica além do Oceano.
Por isto este apelo tão forte para ficar “em sua pequena terra”, por isto os suicídios de jovens kaiowa que não encontram mais as condições que necessitam para viver plenamente as suas identidades. Não dá para se calar diante disto, vamos ler esta carta com carinho, divulgar amplamente e aprender com ela. Que as suas palavras cheguem ao coração daqueles que podem decidir o futuro desta comunidade indígena.
TEKOHA GUARANI-KAIOWÁ ÑANDERU LARANJEIRA-RIO BRILHANTES-MS, EM 26 DE JANEIRO DE 2012.
Para: todas as autoridades das Justiças do Brasil.
Senhores juízes federais do Brasil, nós 170 membros (100 crianças, 30 idosos, 40 adultos) do povo indígena Guarani-Kaiowá da tekoha (terra) Ñanderu Laranjeira, vimos através desta carta explicitar as nossas vidas diárias diante da última. ordem de despejo expedida pela Justiça Federal em Dourados-MS. Em primeiro lugar, queremos contar a todos os juízes e sociedades que estamos coletivamente em estado de medo, desespero e dor profundo, já sobrevivemos em situação mísera e perversa há várias décadas. Hoje no dia 26/01/2012, nós compreendemos claramente que nós não temos mais chances de sobreviver culturalmente e nem fisicamente neste país Brasil, visto que em qualquer momento seremos despejados de nossa área antiga reocupada por nós, portanto estamos com muita tristeza e perplexa, ao receber esta notícia da oficial da Justiça e da Polícia Federal e FUNAI.
Já estávamos com a alegria praticando o nosso ritual sagrado dia-a-dia aqui em minúscula terra antiga reocupada Ñanderu Laranjeira em que retornamos nos últimos dois anos. Aqui em pequeno espaço só passamos a praticar apenas os nossos rituais religiosos sagrados jeroky para preservar a nossas vidas e garantir a nossa sobrevivência como povo indígena originário do Brasil. Aqui em pequeno espaço de terra antiga somente estamos exclusivamente para sobreviver culturalmente, tentamos reeducar as crianças na nossa cultura para vida boa, por isso praticamos diariamente o ritual religioso sagrado onde transmitimos entre a nova geração o bom viver futuro teko porã para não se envolver nas violências adversas existentes em toda a parte do Mundo, queremos garantir a vida boa teko porã de todas as crianças indígena que estão nascendo e crescendo aqui em pequeno espaço de terra antiga Ñanderu Laranjeira.
Queremos sobreviver dignamente e culturalmente, com essa grande esperança retornamos e estamos aqui em pequena terra antiga. Nós não somos um povo indígena nocivo e nem destrutivo. Em torno de nosso acampamento há plantação de soja, nós aconselhamos-nos para não estragar e nem fazer mal a ninguém, respeitamos os não-indígenas os proprietários de lavoura de soja, mesmo que eles ameaças nossas vida diariamente de modo cruéis, impendido a estrada de nós, não deixando entrar para nós as assistências à saúde a os alimentos, etc.
Diante disso, há dois anos, nós comunidades indígenas apenas rezamos para que eles (os brancos) compreendam a nossas vidas e nossas histórias antigas neste local, não agredimos ninguém porque o nosso ritual religioso controla a nossa vida e nosso comportamento diariamente, para isso rezamos e acabamos de construir uma casa de reza oga pysy no pequeno espaço de terra antiga. Hoje (26/01/2012) recebemos aviso triste da oficial da Justiça juntamente com a PF e FUNAI que seremos despejados as forças policiais em qualquer momento de nosso pequeno espaço antigo. O lugar pequeno antigo em que estamos morando hoje há ainda muitas plantas medicinais ao longo de rio e córrego, há ainda sapé para cobrir a casa, por isso acabamos de construir várias casas de sapé. Aqui estamos felizes com as criançadas, rezando todas as noites, educando diariamente para que não se envolvam nas violências adversas. Aqui não ameaçamos a vida de não-índios e nem corremos risco de ameaças dos não-índios, por isso nos sentimos bem integralmente nesse pequeno espaço de nossa antiga.
Por essa razão, pedimos para permanecer aqui para continuar a prática de nossa cultura e garantir um futuro melhor de nova geração indígena para o país Brasil. Não queremos ser despejados daqui. Em outro espaço de terra distante não seremos felizes e nem seremos seguros para mantermos a nossa vida e prática culturais vitais já fortalecidos e preservados aqui no pequeno espaço antigo Ñanderu Larajeira. Não queremos perder mais a nossa nova geração (crianças e jovens) para o mundo de violências existentes tanto nas aldeias superlotadas quanto nas margens da perifeiras das cidades e rodovias, por isso contamos com a compreensão e atenção de Vossas Excelências para que possamos continuar sobreviver culturalmente aqui no pequeno espaço antigo Ñanderu Laranjeira em que iniciamos a nova vida boa longe das violências adversas existentes das aldeias superlotadas e das margens da BR.
Queremos sobreviver culturalmente e fisicamente aqui, queremos proteção e apoios vitais das Justiças do Brasil para garantir a nossa nova geração guarani-kaiowá neste país sem vítimas de violências perversas. A partir de hoje, a princípio a nossa sobrevivência depende exclusivamente da Justiça do Brasil, por isso confiamos nas compreensões das Justiças do Brasil.
Aqui aguardamos as visitações e ações das Justiças do Brasil.
Atenciosamente,
Assinamos nós 170 membros (100 crianças, 30 idosos, 40 adultos) do povo indígena Guarani-Kaiowá da tekoha (terra) Ñanderu Laranjeira-Rio Brilhantes-MS.
Nenhum comentário:
Postar um comentário