Roldão Arruda
Do O Estado de S.Paulo
Do ponto de vista da redistribuição de terras, 2013 caminha para ser o pior ano da reforma agrária desde o início do período da redemocratização, em 1985. Faltando menos de três meses para o fechamento das atividades do ano, a presidente Dilma Rousseff ainda não assinou nenhum decreto de desapropriação de imóvel rural, por interesse social, destinando-o para a criação de assentamentos rurais.
Se mantiver a caneta imobilizada, ela vai ficar atrás de Fernando Collor de Mello - o presidente que menos se interessou pela reforma nos 28 anos da redemocratização. Em 1992, ele assinou apenas quatro decretos declarando imóveis rurais de interesse social para a reforma - o menor índice de todos (o maior coube a Fernando Henrique Cardoso, com 845 decretos assinados em 1998).
A ausência de decretos também pode confirmar de maneira cabal a inflexão que Dilma decidiu imprimir ao tratamento da reforma desde o início de seu mandato. Em 2010, prestes a deixar o Palácio do Planalto, o então presidente petista Luiz Inácio Lula da Silva assinou 158 decretos de desapropriação de imóveis rurais. No ano seguinte, a afilhada política dele baixou a marca para 58. Em 2012, ela manteve o freio e reduziu para 28 decretos.
Na avaliação do Movimento dos Sem Terra (MST), maior organização do País dedicada à luta pela redistribuição de terras, a inflexão se deve à aproximação da presidente com grupos ruralistas que se opõem à reforma. "O governo Dilma é refém do agronegócio", afirma Alexandre Conceição, da coordenação nacional do movimento. Segundo suas informações, existem 150 mil famílias acampadas no País, à espera de lotes de terra. A maior concentração de acampados estaria na Bahia, com 50 mil famílias.
Proveniente daquele Estado, o deputado federal petista Valmir Assunção não poupa críticas a Dilma. Ele tem dito que o governo dela já representa "os piores anos para a reforma agrária no Brasil".
Campanha
O protesto mais bem organizado contra a política do governo, porém, partiu de dentro do próprio governo, entre os engenheiros agrônomos lotados no Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra). Em briga com o Ministério do Desenvolvimento Agrário por questões salariais, na semana passada eles lançaram uma campanha nacional denominada Falecimento da Reforma Agrária.
Além de divulgarem estatísticas apontado a queda nas desapropriações, realizaram atos públicos nos quais foram usados caixões funerários para a encenação do enterro da reforma.
"A ausência de desapropriações reflete uma decisão do governo, que negligencia há muito tempo a gestão das terras do País. Só não tiveram a coragem ainda de dizer isso à sociedade", diz Ricardo Pereira, presidente do Sindicato Nacional dos Peritos Federais Agrários, que organizou o protesto.
'O ano não acabou'
O presidente do Incra, Carlos de Guedes, contesta as críticas. Reconhece que ainda não foi assinado nenhum decreto de desapropriação, mas ressalva que o ano não acabou. "No ano passado, disseram que não iríamos assentar nem dez mil famílias e chegamos a 23 mil", afirma.
Guedes também observa que, mesmo sem desapropriações, 10 mil famílias foram assentadas neste ano. "Nós adquirimos imóveis por compra e venda, tivemos destinação de áreas em terras públicas, tivemos governos estaduais destinando terras para a reforma e o Incra entrando junto. São os processos usuais da reforma agrária", diz.
Segundo o presidente do Incra, a maior preocupação do governo no momento não são os decretos de desapropriação. "O grande desafio é viabilizar o assentamento. Não adianta só dar terra", diz. "Estamos implementando mudanças significativas para acelerar a implementação de políticas públicas nos assentamentos. Hoje, quando as famílias entram na terra, o programa Minha Casa Minha Vida já começa a trabalhar a questão da habitação. Antes, o Incra demorava de quatro a cinco anos para fazer uma moradia."
Nenhum comentário:
Postar um comentário