Da AS-PTA
Cerca de 30 mil hectares são utilizados no Chile para a produção de sementes transgênicas de milho, soja e canola para exportação, que são comercializadas por Monsanto e Pioneer e por empresas chilenas agrupadas na ANPROS – Associação Nacional de Produtores de Sementes.
Pizarro era um produtor de hortaliças na província de Melipilla. Ele nunca procurou a Monsanto: ao contrário, a empresa chegou ao local onde ele cultivava suas hortas, dizendo que o havia localizado por satélite e que o lugar era bom para o plantio de milho transgênico, pois não havia outras plantações do grão convencional por perto.
No primeiro ano de parceria (2008) a empresa disponibilizou a semente transgênica e o herbicida Roundup. Pizarro só teve que comprar adubos e inseticidas. A empresa chegou a pagar inclusive o arrendamento da terra. O agricultor só devia cuidar da plantação, pelo que a empresa ofereceu pagar 3 milhões de pesos (cerca de R$ 13 mil) por hectare.
Em 2009 a empresa também disponibilizou a semente, mas o veneno foi comprado pelo agricultor. “Passei dois dias semeando e apesar de eu ter máquinas, a empresa me obrigou a semear com as suas, que são mais novas, e isso representou um gasto enorme”, explicou o produtor.
Nas duas primeiras safras Pizarro obteve grandes lucros com o milho transgênico e a empresa o considerava um excelente produtor. “Em 2009 a empresa quis fazer um experimento.
Éramos 12 agricultores plantando esse tipo de milho no Chile e somente para dois de nós a empresa pediu que semeássemos fileiras de milho eleitas como fêmeas (transgênicas) e eleitas como machos (híbridas) em proporção 4:1; os outros produtores semearam na proporção 4:2.
O SAG (Serviço Agrícola e Pecuário do Chile, na sigla em espanhol) era responsável por fiscalizar a produção e em minha opinião é cúmplice da empresa, pois em seus informes anotou que eu havia semeado na proporção 4:2, o que visivelmente não era o caso”, relata Pizarro.
A produção foi ruim e, consequentemente, os rendimentos também. “O preço é calculado sobre a base da produção do mesmo milho por outros multiplicadores de sementes na região, mas os outros multiplicadores haviam recebido instruções diferentes das que eu recebi, e por isso produziram muito mais que eu.
Eu colhi 106.780 kg de milho, mas a produção real de sementes, selecionada na processadora de Lo Espejo de acordo com os padrões exigidos pela Monsanto, foi de somente 38.509 kg”, diz o agricultor.
Como resultado, Pizarro ficou com uma dívida de 90 milhões de pesos (cerca de R$ 400 mil) junto ao Banco Santander. Perdeu sua casa, sua máquina pulverizadora, um trator e sua caminhonete. Sua mulher o abandonou e ele ficou de mãos abanando.
Em setembro de 2013, Maria Elena Rozas, coordenadora da Rede de Ação contra Agrotóxicos no Chile (RAP-Chile) e Lucia Sepúlveda conheceram a experiência de Pizarro e puderam observar de primeira mão os resultados das práticas ambientais e comerciais da Monsanto/Anasac no Chile.
“O agricultor não sabia exatamente o que semeava, nem tinha ideia do que era uma semente transgênica; no contrato figura um nome fantasia: milho Mon49. No plantio ele tinha que usar obrigatoriamente e de forma intensiva mais de dez agrotóxicos perigosos para a saúde e o meio ambiente.
O contrato que ele assinou o obrigava a recorrer somente à Câmara de Comércio, não podia queixar-se em tribunais. Ele nos explicou que muitos produtores também tiveram problemas com a Monsanto, mas não recorreram à Câmara porque isso sai muito caro”, observa Maria Elena Rozas.
Rodrigo Malagüeño, gerente da Anasac Chile/Monsanto, afirmou que nenhum multiplicador de milho transgênico havia processado a empresa na Câmara de Comércio anteriormente.
Em geral só as grandes empresas podem ir a esse tipo de arbitragem. Mas Pizarro, que não estava disposto a arruinar-se em silêncio, se arriscou: “De início tive que pagar 700 mil pesos (cerca de R$ 3 mil) para que me atendessem e depois 4.400.000 pesos (cerca de R$ 19 mil) para financiar o juiz. Demandei na ação 218 milhões de pesos (cerca de R$ 960,5 mil) e a Câmara de Comércio finalmente decidiu em meu favor, mas só recebi 37 milhões de pesos (cerca de R$ 163 mil), que é muitíssimo menos do que eu perdi”, explica Pizarro.
O processo foi iniciado em 2011 e se prolongou por quase três anos até a Câmara de Comércio finalmente concluir que a Monsanto não cumpriu sua obrigação que consistia em fornecer serviços de supervisão técnica para o plantio de forma diligente, dando estrito cumprimento às instruções do fabricante da semente, incorrendo assim em descumprimento contratual negligente.
O resultado do processo foi confirmado em setembro de 2013, negando o recurso apresentado pela empresa, mas durante os quatro meses posteriores a Monsanto se negou a cumprir a sentença. A indenização somente foi realizada no final de dezembro de 2013.
Pizarro afirma: “agora sou um estudioso dos transgênicos, aprendo através da internet e já me informei sobre a Monsanto e seu prontuário criminal”. Quando tomou consciência do que havia acontecido, se dirigiu à organização Agrupación Ecologista de Aconcagua, que faz arte da campanha Eu Não Quero Transgênicos no Chile, estabelecendo assim contato com a Rede de Ação contra Agrotóxicos no Chile (RAP-Chile) para divulgar seu caso e denunciar a Monsanto.
“Só quero que outros camponeses não tenham que passar pelo que vivi. Nunca mais vou plantar transgênicos”, conclui o agricultor.
Nenhum comentário:
Postar um comentário