quarta-feira, 19 de junho de 2013

Artigo: PARA ONDE QUEREMOS IR ?

Mobilização em SP
 
Após cinco atos em que cada um foi maior do que o outro começo a notar algumas mudanças na linha dos atos o que não necessariamente é ruim. Primeiro o que inicialmente era encabeçado pelo MPL com a ajuda de organizações partidárias, sindicatos e anarquistas, se difundiu em uma grande movimentação política nacional em que todos que possuem alguma questão que o indigna colocam um cartaz ou faixa com uma palavra de ordem.
 
Percebe-se que estamos diante de um movimento de massas suprapartidário e que por conta disso possui suas contradições. Na manifestação de 17/06/13 tinha de tudo, desde gente cantando músicas religiosas, partidos políticos, sindicatos, movimentos sociais, grupos autonomistas, pessoas que pela primeira vez participavam de uma manifestação, etc.
 
Os atos dessa semana com tentativa de ocupação aos prédios que simbolizam o poder do Estado em São Paulo, quais sejam, Palácio dos Bandeirantes na segunda-feira (17/06/13) e Prefeitura ontem (18/06/13), demonstram um sentimento popular de ruptura com a ordem vigente e um anseio por mudanças necessárias.
 
Mas quais mudanças ?
 
Esse é um debate que temos que fazer, pois apesar da cada vez mais pujante movimentação popular, algumas palavras de ordem encontram-se vagas e podem ser um perigo para o próprio movimento.
Primeiramente, temos que ter em vista que não se trata de um movimento nacional, mas sim internacional que está sendo realizado em vários países contra medidas de austeridade na Europa, contra regimes político-econômicos ditatoriais no Norte da África, Eurásia e Oriente Médio, ou seja, nas diversas manifestações contra corporações e o poder econômico como Occupy Wall Street nos Estados Unidos.
 
Não compreender ainda a revolta dos estudantes e trabalhadores no Chile ano passado, e as manifestações em todo o mundo como parte de uma análise de conjuntura internacional é no mínimo reduzir a pauta e o programa que podemos construir que possa servir de ruptura a esse sistema político-econômico a um isolamento que não nos ajudará.
 
Basta ver que por conta da postura de órgãos como Anistia Internacional, e a própria imprensa internacional, nossa imprensa teve que mudar o tom da linha editorial. Não compreender essa pressão internacional pode causar erros de análises.
 
Nesse sentido, bandeiras genéricas como combate à corrupção ou até questões pessoais que possam lhe atingir diariamente, apesar de importantes podem ter um ponto de inflexão para inclusive dissolver o potencial que pretendemos que tenha esse movimento.
 
Não compreender isso, é deixarmos nas mãos daqueles que continuam no poder os rumos da manifestação. Só para dar um exemplo, tinha um grupo com a bandeira FORA COLLOR. Pode a primeira vista até parecer anacrônico, Collor ? Pq não Alckmin e/ou Haddad ? Mas aí vem a questão. Apesar de todo o movimento criado na década de 90 para o impeachment do então presidente Collor  de Melo este voltou para a cena política e como senador.
 
Isso é importante dizer, pois apesar da importante manifestação naquela época, não se verificou de fato uma ruptura com a ordem vigente.
 
Vejam também que ordem vigente é algo que já apareceu umas duas ou três vezes neste texto, podem até não concordar, mas realmente ordem e progresso é uma frase que queremos manter ? Um movimento que busca romper com a decadência sistêmica e ao “sono” que se propagou vai buscar manter a ordem ?
 
Só para efeito de esclarecimento Ordem e Progresso é uma bandeira oriunda da construção positivista que busca acima de tudo legitimar a institucionalidade  e o status quo, logo não se coaduna com os anseios que se querem elevar de ruptura a toda a exploração sofrida.
 
Fazer um exercício de levantamento histórico é importante também para deixar as coisas mais claras e evitarmos cometer os mesmos erros.
 
Nesse sentido temos que dar um salto de qualidade na organização, convocando por exemplo assembleia para que o movimento discuta os seus próximos passos de forma transparente e democrática. Os trajetos tem que estar claros para quem está na rua, bem como o objetivo final, para não perdermos força em ações mais concentradas e que podem causar maior impacto político.
 
Algumas coisas poderiam ser melhores nesse sentido. A criação de núcleos de organização em locais de trabalho, universidades, bairros, também pode ser um diferencial para que o movimento se organize e esclareça suas pautas de reivindicação em algo que possa ser compreendido por todos nas passeatas.
 
Por exemplo, Não são só R$0,20 , mas os vinte centavos também são importantes. A redução da tarifa e até propostas que surgem entre os manifestantes como estatização do transporte público e Tarifa Zero, são pautas que o movimento tem que compreender como um todo e avocar para si, verificando a democratização do transporte público.
 
No entanto, e aí que vem a questão abaixar os vinte centavos, mas como ? Reduzindo a arrecadação de tributos para as empresas de ônibus e metrô por exemplo ? Dar mais privilégios para esses setores obviamente não é o anseio do movimento.
 
Não se pode reduzir tributos para as empresas de ônibus, que faltará por exemplo para outras bandeiras do movimento como saúde, educação e moradia. Ou vamos cair no mesmo sentido de desvio de verbas pública para interesses privados que tanto criticamos quando falamos “Copa do Mundo eu abro mão, da minha casa eu não saio não !”.
 
Outras bandeiras como combate a PEC 37 (que retira poder de investigação do Ministério Público), e a abertura da caixa preta dos contratos e licitações, bem como bandeiras como pelo fim da polícia, surgem no movimento e devem ser trabalhadas conjuntamente.
 
Nesse sentido, para que não roubem nossas manifestações e que elas realmente não sejam só uma caminhada pela cidadania, mas também uma luta por outro projeto de sociedade, em que as demandas possam ser plenamente atendidas, com uma mudança abrupta no sistema político-econômico não só nacional, mas também internacional, nos unindo de fato aos trabalhadores de diversos países que lutam contra as opressões nacionais, precisamos dar um salto organizativo, para que de fato se consigamos centrar fogo em nossas reivindicações.
 
Sobre os partidos políticos nas manifestações e o movimento antipartido
 
Sobre isso é interessante afirmar que soa também dissonante aos anseios de mais democracia e mais força que justamente uma bandeira de partidos que antes do “gigante acordar” já tomavam borrachadas da polícia, bombas, prisões, chamados de vândalos sejam impedidos agora com o movimento de massas que eles tanto aguardaram a abaixar as bandeiras. Esses partidos de esquerda não se opõem as manifestações. Aliás, foram os únicos que desde o início defenderam as manifestações. Digo início quando tinham apenas 5 mil manifestantes em São Paulo e movimentos incipientes em outros Estados.
 
Não é pouco lembrar que não faz muito tempo muitos trabalhadores buscavam legalizar partidos políticos no Brasil, visto que a ditadura militar impedia a organização de qualquer tipo, reprimindo com torturas e assassinatos, em nome pasmem de uma “democracia”.
 
As pessoas podem levantar bandeiras e cartazes dizendo que são contra partidos, é um direito também, mas impedir ou obstruir os revoltados que antes do “gigante acordar” estavam na rua, inclusive sendo criticados por alguns que hoje fazem parte das grandes manifestações é um ponto também a ser refletido. Os anarquistas tem suas bandeiras pretas, por exemplo, que são legítimas também e devem ser garantidas, ou não ? Vão mandar abaixar também ? Se não porque algumas podem como do Brasil e outras não ? A quem interessa desqualificar organizações de trabalhadores.
 
 Fora que Mussolini na Itália fez a mesma coisa, impedindo que partidos participassem das manifestações.
 
Dito isso fica essa questão: Qual a referência que queremos ?
 
A luta é internacional
 
Nesse sentido, acredito que devemos continuar nos manifestando nas ruas, e compreender que não é uma questão de patriotismo (pelo menos para mim) e sim de luta contra a ordem global hoje vigente.
Acreditar que o Brasil acordou é bom, mas para quê acordou ? E só o Brasil acordou ? Não acredito nisso, acredito que estamos em uma nova etapa no mundo todo e que gritos como Acabou a inércia... isso aqui vai virar a Grécia não são à toa ? A questão vai muito além da palavra Nação. Quem são esses que no mundo todo estão lutando e que historicamente foram atacados ? Não seriam os trabalhadores e não precisaríamos como diz aquela música do Sal da Terra “Vamos precisar de todo mundo para varrer do mundo a opressão “ ?
 
Acho que a história é por aí. Sei que muitos que se manifestam não entenderão tudo que estou colocando, aliás, acho que muita gente não está entendendo as palavras que outro levanta, mas por isso mesmo que acredito que organizar seja necessário. Construir uma alternativa de sociedade que contemple as demandas necessárias (na minha opinião dos trabalhadores) é mais do que essencial. Mas vamos discutir ou não ? Isso também determinará os rumos desse movimento e para onde queremos ir.
VEEM...VEEM...VEM PARA RUA VEM !
 
*Igor Lodi Marchetti - Militante da LSR e do PSOL- SP.

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