terça-feira, 10 de dezembro de 2013

Carta dos povos indígenas e quilombolas do Maranhão

(Fotos: Cimi)
 
Nós, Quilombolas e Indígenas do Maranhão, reunidos nos dias 12, 13 e 14 de novembro de 2013 no I Encontro de Indígenas e Quilombolas do Maranhão, no Centro Diocesano de Mangabeira, município de Santa Helena Diocese de Pinheiro – Maranhão, compartilhamos nossa alegria de viver, denunciamos as injustiças e anunciamos um novo tempo de luta e de resistência.
 
Indígenas dos povos Krikati, Pykobjê – Gavião, Krenyê, Tenentehar/Guajajara, Krepumkatjê, Movimento Quilombola do Maranhão (Moquibom) e comunidades quilombolas do Tocantins, Amapá, Rondônia, Pará, Mato Grosso e Minas Gerais, Conselho Indigenista Missionário – CIMI, Comissão Pastoral da Terra – CPT, Universidade Federal do Maranhão – UFMA, Justiça nos Trilhos, Cáritas, CSP-Conlutas, entre outas entidades de apoio à luta dos povos indígenas e quilombolas, refletimos, cantamos, dançamos e decidimos que o momento é união de experiências, de união de forças para denunciar as constantes violações aos nossos direitos, as constantes perseguições às nossas lideranças, a persistência do racismo e da discriminação ao nosso jeito de viver, de sentir, de pensar, de se expressar.
 
Com nossa cantoria e o toque do tambor, no gingado da nossa dança reafirmamos nossa identidade quilombola. Com nossos maracás e nossos pés batendo forte no chão anunciamos que somos povos indígenas desta terra e é nosso esse espaço. Trocamos experiências de resistência; compartilhamos nossa dor pela constante discriminação que sofremos pela sociedade, pela violência e criminalização de nossos movimentos e prosseguimento do genocídio de nossos povos. Conhecemos a forma de viver e de celebrar de cada povo; cantamos em nossa própria língua a história de nossos antepassados e por eles e por nossos filhos e netos que virão reafirmamos nossas identidades. O tambor e o maracá soaram em conjunto o anúncio de novos tempos de resistência e certamente o fogo aceso será sinal de celebração de novas conquistas.
 
 Nós, lideranças indígenas e quilombolas denunciamos as constantes invasões de madeireiros e os ataques de ruralistas, mineradoras, de forças armadas e do agronegócio que querem tomar e mercantilizar nossos territórios. Repudiamos a constante tentativa de cooptação de lideranças de nossos movimentos através de políticas compensatórias ilusórias e da sedução do dinheiro e do poder que dividem e trazem conflitos enfraquecendo a resistência.
 
Denunciamos a tentativa de aprovação de leis que ameaçam retirar direitos historicamente conquistados. Mostra-se vil a união do governo e dos deputados com o aval do judiciário em prol de uma proposta de crescimento econômico à custa do sangue dos nossos povos, da vida dos nossos rios e das nossas matas.
 
A participação e compromisso da juventude de nossos povos neste encontro anuncia que a resistência se renova à luz da sabedoria de nossos ancestrais e da experiência de nossos guerreiros e guerreiras apontando para um tempo de luta e de conquistas que será celebrado sobre o chão dos nossos territórios, sob a sombra de nossas árvores, ao som dos nossos maracás e tambores, cantando nas diversas línguas a chegada de uma nova era. Santa Helena-Maranhão, 14 de novembro de 2013.

segunda-feira, 2 de dezembro de 2013

Energia nuclear: falsa solução para um falso problema

Existe uma ação de manipulação da opinião pública – concatenada pelo lobby nuclear – com foco em Pernambuco (Nordeste), voltada a propagandear e defender a necessidade de se instalarem usinas nucleares na região. Isso ocorre através de editoriais nos jornais, reportagens auto-promotoras, entrevistas com “especialistas”, tudo dirigido a subverter a opinião pública com informações, no mínimo, dúbias sobre esta fonte energética tão polêmica. Infelizmente, não se pratica um jornalismo informativo, nem investigativo. Não se ouve e nem se dá o mesmo destaque ao outro lado da questão, aos críticos.

Neste ano, em particular, ocorreram diversas iniciativas neste sentido, e recursos financeiros consideráveis foram despendidos, para evidenciar junto à opinião pública os benefícios, a inexistência de riscos e a necessidade “urgente” de a região receber uma usina nuclear (ou mais de uma).

Aos defensores dessa tecnologia, apoiados pela grande mídia (que precisa das verbas de publicidade para sobreviver), se juntam alguns setores acadêmicos (que recebem recursos para financiar suas pesquisas), grandes empreiteiras, fabricantes de equipamentos, e – por motivos óbvios – setores militares, todos com amplo espaço na “mídia amiga” para alardear a sua concepção e assim formar uma opinião pública favorável a este tipo de empreendimento que, em países desenvolvidos, já vem sendo abandonado.

Nesse contexto, o vale tudo e a insanidade predominam. Chegam à raia da desonestidade científica e intelectual ao afirmarem que “as usinas nucleares não oferecem risco à população”. Deixa-se mesmo de levar em conta a tragédia do desastre em Fukushima (Japão, março 2011), que parece não ter fim, pois as atividades de limpeza da área da usina devem levar ainda mais 40 anos. E o que agrava mais a situação é que será preciso ainda desenvolver tecnologias para finalizar esse trabalho sem precedentes.

Outra seara que emerge nesse debate – onde o nuclear se apresenta como falsa solução, para um falso problema – é com relação aos apagões e apaguinhos (interrupções de energia elétrica) dominantes e recorrentes no dia a dia da população da região. Apregoam que tudo seria diferente se as usinas nucleares estivessem funcionando. Mentem descaradamente associando eventos que estão ligados à questão da gestão do setor elétrico, à falta de investimentos e de manutenção das redes, e mesmo à incompetência dos gestores do sistema elétrico nacional. Querem fazer crer que as usinas nucleares resolveriam o problema dessas interrupções no fornecimento de energia elétrica que a população brasileira vem tendo que suportar.

Afirmam também que a eletricidade nuclear é barata e não vai onerar o bolso do consumidor. Tudo mentira. A energia nuclear é uma das mais caras fontes energéticas comerciais, com enormes subsídios, que desviam recursos e mascaram o preço final do megawatt/hora (Mw/h) produzido.

A falácia maior é a afirmativa de que não produz gases de efeito estufa, sendo assim uma “fonte limpa” de energia. Não levam em conta que, para se obter o combustível nuclear, são utilizados diversos processos industriais (mineração e produção do concentrado, conversão, enriquecimento, reconversão, fabricação de pastilhas e de elementos combustíveis...), que contribuem para a produção e emissão de considerável quantidade de CO2.

Fonte limpa coisa nenhuma.

Não se justifica, tampouco, a afirmação de que essas usinas vão incrementar o desenvolvimento regional através de aumento do emprego e da renda, pois estudos da Organização Internacional do Trabalho (OIT) e do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) comprovam que as indústrias ligadas às cadeias produtivas de energia eólica e de energia solar geram mais emprego e renda do que a cadeia da indústria nuclear.

Há ainda os resíduos – o chamado lixo atômico –, um dos enormes problemas dessa tecnologia de produção de energia elétrica. Esses resíduos são deixados para as gerações futuras, uma vez que não se sabe qual destinação dar a eles, cuja radiação permanece ativa por milhares de anos.

Concluindo: temos que dizer, em alto e bom som, que o Brasil, o Nordeste e Pernambuco não precisam de usinas nucleares. Xô Nuclear.

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Heitor Scalambrini Costa é professor na Universidade Federal de Pernambuco.

Fifa é a 2ª pior corporação do mundo por denúncias de violações aos direitos humanos

As remoções forçadas e os deslocamentos causados pela busca de moradia, assim como a repressão a protestos contrários à realização da Copa do Mundo no Brasil, que ocorrerá no próximo ano, inseriram a Fifa (Federação Internacional de Futebol Associado), na lista das corporações que mais interferem na manutenção dos direitos humanos. Pelo ranking do observatório internacional The Public Eye Awards, que irá "premiar" a pior organização por meio de votação popular e um júri especializado, a fundação esportiva é a vice-campeã da lista - a líder é a russa Gazprom, considerada a maior exportadora de gás natural do mundo.

De acordo com a organização, os moradores vizinhos às construções dos estádios criados ou reformados para sediar os jogos foram obrigados a sair de suas casas sem uma alternativa vantajosa.

"Em Recife, só em 2013, mais de 2.000 famílias da Comunidade Coque foram forçadas a sair de suas casas. Além disso, a criação de zonas de exclusividade da Fifa vai obrigar inúmeros vendedores ambulantes a ficar fora do negócio. Em Belo Horizonte, mais de 130 perderam sua fonte de renda durante a reconstrução de um estádio, e agora estão proibidos de vender na vizinhança".

Também não há interesse da Fifa, segundo o observatório, em promover o comércio local e nem o desenvolvimento das pequenas empresas familiares que, durante o evento esportivo, poderiam se beneficiar do mercado emergente.

"Fifa mantém zonas de exclusão com um raio de 2 km em torno dos estádios, onde eles controlam o movimento de pessoas e na venda de produtos, colocando inúmeros vendedores ambulantes fora do negócio. Os pobres estão arcando com o ônus da carga e são recebidos com repressão feroz quando tentam lutar por seus direitos".

Mais informações podem ser obtidas, em inglês, neste site.

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Arte: The Public Eye Awards

Fonte: Jornal GGN.

Ato contra práticas antissindicais e em defesa da Convenção 151 ocorre terça-feira (3)


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Com o objetivo de denunciar ações de governos e patrões que atentam contra a liberdade e organização sindical, na próxima terça-feira (3), entidades do movimento sindical promoverão um ato sobre “Pratica antissindical e Convenção 151”.


O ato terá como convidados o diretor adjunto da Organização Internacional do Trabalho (OIT), Stanley Gacek, e o procurador do MPT da 7ª Região e coordenador da Conalis (Coordenadoria Nacional de Promoção da Liberdade Sindical), Francisco Gerson Marques.

Para a advogada de entidades sindicais, Eliana Lacerda, há uma política do governo em retirar direitos, por isso é fundamental que estas questões sejam discutidas.  “As organizações sindicais estão sofrendo ataques tanto na garantia do exercício de greve quanto na questão da organização e independência de entidades sindicais. Há ainda uma política do governo de criminalizar os movimentos”, destaca Eliana, acrescentando a importância desse ato que denunciará essas práticas nocivas ao trabalhador.

Será abordada no ato a tentativa do governo federal em enviar ao Senado uma proposta que “regulamente” o direito de greve dos servidores. 

Outro exemplo destacado na atividade será sobre a demissão dos 66 metroviários, em 2007, após realização de uma greve. O fato foi apresentado para a Organização Internacional do Trabalho (OIT) que condenou o governo brasileiro por prática antissindical. Porém, os representantes do governo e do Metrô informaram não reconhecer a entidade internacional.

Convidados - A atividade é organizada pelo Sindicato dos Metroviários de São Paulo e  FENAMETRO e contará com a  participação do SINTRAJUD/SP, SINDSEF/SP, Sindicato das Universidades Federais do ABC, Associação dos Professores de Osasco e Região – APOS, entre outras entidades convidadas e com o apoio da CSP-Conlutas entre outras centrais.

Local – O ato será realizado no dia 3 de dezembro (terça-feira), às 18h30, no Sinsprev (Sindicato dos Previdenciários de São Paulo). O endereço é rua Antonio de Godoy, 88, 5º andar, Centro, São Paulo/SP.

Greve de Universidades: ocupação da AL-CE promete segunda-feira agitada

Sem diálogo e com restrições, movimento articula dia movimentado e mantém local ocupado     
Depois de cinco dias de ocupação na Assembleia Legislativa do Ceará, e sem nenhum sinal de diálogo com o governador Cid Gomes, principal reivindicação da mobilização e dos trabalhadores e estudantes em greve, professores, alunos, técnico-administrativos da Universidade Estadual do Ceará (UECE), Universidade Regional do Cariri (URCA) e Universidade Estadual do Vale do Acaraú (UVA) reclamam das restrições decorrentes do descumprimento de acordos e prometem dia de agitação para esta segunda-feira (2), visitando os gabinetes de cada parlamentar da Casa, a fim de coletar assinaturas para a campanha que apela ao governador Cid Gomes a abertura das negociações, bem como o de exigir nova reunião com a Mesa Diretora da AL para que sejam retomadas as regras firmadas no início da ocupação que já conta com o apoio de diversos setores da sociedade cearense.    

 Os que participam da ocupação foram proibidos de transitar pelo pátio externo da AL durante o final de semana, mesmo após grevistas alertarem sobre a necessidade do banho de sol. Tal impedimento trouxe à tona críticas decorrentes do descumprimento do acordo firmado na última quarta-feira (27) pelo presidente em exercício da Casa, o deputado Tin Gomes, que previa, entre outros pontos, a garantia da integridade física e uma lista de manifestantes com permissão de entrada e saída do prédio. 

Contudo, de acordo com o movimento, além da presença constante da Tropa de Choque, as pessoas que estão na ocupação e precisam sair estão sendo proibidas de retornar.   Histórico  A greve geral, deflagrada em 29 de outubro a partir da UECE, diz respeito à reivindicação de professores, estudantes e técnico-administrativos sobre a melhoria da infraestrutura e condições de trabalho, estudo e permanência nas três universidades estaduais. A realização de concurso público, a regulamentação do Plano de Cargos, Carreira e Vencimentos (PCCV) e o estabelecimento de uma política suficiente de assistência estudantil fazem parte das demandas mais urgentes apontadas pelo movimento. 

12° Leilão chega ao fim: riquezas brasileiras são entregues ao capital privado e meio ambiente é posto em risco

Acaba de ser finalizado o leilão da 12ª rodada de petróleo. Previsto para ser realizado em dois dias, 28 e 29 de novembro, o leilão foi fechado em apenas um dia com arrecadação de R$ 165,196 milhões. 

Além de mais uma entrega das riquezas naturais brasileiras para o capital privado, outro aspecto chama atenção nesta privatização. São os enormes riscos para o meio ambiente e possível contaminação das reservas dos aquíferos de água doce do país com a extração do gás de xisto.   

“Não é preciso que arrisquemos o nosso meio ambiente adotando essa técnica que comprovadamente é prejudicial. Isso reflete a ganância do governo e empresários que em busca de mais lucro não se importam com os impactos que essa exploração pode acarretar”, destaca o dirigente da Federação Nacional dos Petroleiros (FNP), Claiton Coffi.  

 Essa exploração envolve a extração do gás de folhelho a partir da técnica de Fracking (fratura das rochas) através de explosões no subsolo. Para isso é injetado um coquetel com mais de 600 produtos químicos altamente tóxicos. 

Nos Estados Unidos, essa técnica levou a contaminação de aquíferos, lagos e rios devido ao enxofre que se desloca pelas fendas artificiais. O gás ainda contamina o ar que se respira nas regiões próximas. Essas substâncias tóxicas podem causar câncer, má formação congênita e morte de animais. Existe ainda registro de terremotos associado à técnica do Fracking.  

 Para o dirigente da Federação Nacional dos Petroleiros (FNP), Claiton Coffi, “o governo está fazendo algo escandaloso do ponto de vista ambiental, pois o risco de contaminação do solo com a extração do gás de folhelho (gás de xisto) é grande e o método a ser adotado para extração (fratura de rochas) já condenado em vários países”, alertou. 

  Nos Estados Unidos, essa técnica levou a contaminação de aquíferos, lagos e rios devido ao enxofre que se desloca pelas fendas artificiais. O gás ainda contamina o ar que se respira nas regiões próximas.

 Essas substâncias tóxicas podem causar câncer, má formação congênita e morte de animais. Existe ainda registro de terremotos associado à técnica do Fracking.   

As áreas que serão exploradas concentram-se nos estados do Amazonas, Acre, Tocantins, Alagoas, Sergipe, Piauí, Mato Grosso, Goiás, Bahia, Maranhão, Paraná, São Paulo, totalizando 168.348,42 Km².   Mobilização - Como parte da luta para tentar barrar esse ataque ao meio ambiente a CSP-Conlutas, no Rio de Janeiro, o Sindpetro RJ, a FNP  e entidades do movimento sindical realizaram um ato público  em frente ao local onde estava ocorrendo o leilão.     

No nordeste, onde estão concentradas as maiores áreas a serem leiloadas, os petroleiros também se mobilizaram para barrar mais essa entrega das riquezas brasileiras ao capital privado.  Na sede da Petrobrás em Sergipe, e no Tecarmo e em Carmópolis, houve paralisação de duas horas. 

ESTAIADINHA ARRANCA ACORDO DE MORADIAS EM SÃO PAULO

Depois de muita luta, Prefeitura garantiu atendimento para os sem-teto!


Após mais de 10 dias de acampamento na Avenida do Estado, as mais de 200 famílias despejadas da Ocupação Estaiadinha arrancaram junto com o MTST um acordo com a Prefeitura de São Paulo.

De imediato a Prefeitura garantiu auxílio emergencial por 9 meses.

Além disso assinou acordo para a construção de moradias definitivas para as famílias. 

O MTST continuará acompanhando a situação e organizando os sem-teto da Estaiadinha para garantir que os compromissos sejam cumpridos. 

A luta é pra valer!

O mapeamento dos conflitos ambientais no Brasil


Por Joan Martinez-Alier*
Da CartaCapital


No dia 22 de dezembro de 2013, completam-se 25 anos do assassinato de Chico Mendes (1944-1988), morto em Xapuri, no estado do Acre, por defender a Amazônia contra o desmatamento. Chico Mendes era um seringueiro, e foi um sindicalista que defendia os seringueiros contra os poderosos fazendeiros que queimavam a floresta. Ele havia aprendido a ler, ainda menino, com um velho comunista que vivia escondido nessa fronteira entre o Brasil e a Bolívia, um sobrevivente da Coluna Prestes.

Desde então, longe de diminuir, os conflitos decorrentes do desmatamento e da expansão da fronteira agropecuária continuam crescendo por toda a Amazônia. Repetidas vezes, são produzidas mortes por causa dessa expansão. Mas também há outros conflitos que decorrem de injustiças ambientais, além do desmatamento e da fronteira agropecuária, como pela expansão da mineração, por infraestrutura (estradas, grandes usinas) e por contaminação de agrotóxicos.

Já faz dez anos que se formou no Brasil uma Rede de Justiça Ambiental. Os ativistas receberam a visita de Robert Bullard, que nos Estados Unidos levava décadas de luta contra o "racismo ambiental", quer dizer, lutando contra a contaminação em bairros onde vive gente de cor e gente pobre. Isso deu impulso para a Rede Brasileira de Justiça Ambiental. Para dar mais visibilidade a tantos casos de injustiças e conflitos abertos, ocorreram várias tentativas, em nível estadual (como Rio de Janeiro e Minas Gerais) de fazer um inventário e mapear tais conflitos.

Esses esforços culminaram na publicação online de um inventário e um mapa geral dos conflitos ambientais no Brasil, e também em um livro, lançado em novembro de 2013, compilado por Marcelo Firpo Porto, Tania Pacheco e Jean Pierre Leroy com o título Injustiça ambiental e saúde no Brasil: O mapa de conflitos. Trata-se de um trabalho pioneiro no mundo, com 400 casos inventariados, cada qual com uma descrição de dois ou três páginas que incluem suas características principais. Por exemplo: se é um conflito por mineração ou por petróleo, por resíduos nucleares, por grilagem de terra, por asbesto ou por amianto? Quais são os principais atores envolvidos? Quais foram os resultados?

Na Colômbia já existe um mapa parecido (em colaboração com o projeto EJOLT), mas com apenas 70 casos. O mesmo na Turquia, e também no México, há diversas iniciativas nesse sentido. O Observatorio de Conflictos Mineros de América latina (OCMAL) é uma rede que publica inventários e mapas. O tema está crescendo tanto na prática e na pesquisa acadêmica que se anuncia e se prepara um primeiro Congresso Latino-americano de Conflitos Ambientais, a ser realizado na Universidad Nacional General Sarmiento, em Buenos Aires, em outubro de 2014. Não para resolver os conflitos em benefício das empresas, mas para estudá-los, para difundi-los, e para dar-lhes um sentido histórico.

Qual é então o propósito destes inventários e mapas, além do avanço científico da ecologia política? Trata-se de mostrar as causas estruturais de tantos e tantos conflitos, ou seja, como nascem do aumento do  metabolismo da economia mundial e da exportação crescente de matérias primas... Não são casos NIMBY (not in my backyard, "não no meu quintal"), mas sintomas do grande movimento mundial por justiça ambiental. Por exemplo, no Brasil surgiu um movimento que se chama Justiça nos Trilhos, em protesto contra os acidentes nas vias férreas que transportam matérias primas aos portos de exportação, pelo impacto da grande mineração em Carajás e a Estrada de Ferro Carajás, com impacto principalmente no Maranhão, Pará e Tocantins. Há protestos semelhantes em outros lugares do mundo. Ainda no Brasil, existe o Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), que são afetados por represas e usinas, o mesmo que acontece no México com o MAPDER.

Trata-se de dar visibilidade às populações afetadas, de colocar na mesa as suas demandas, suas estratégias de resistência e as alternativas que pleiteiam.

Em muitos conflitos aparecem incertezas científicas (quão prejudicial pode ser o uso de cianeto na mineração de ouro a céu aberto?) Como o glifosato utilizado no cultivo de soja transgênica afeta às populações?), e por isso o debate deve ser aberto para as populações locais pobres que conhecem melhor do que as distantes autoridades sanitárias oficiais o que está acontecendo. Os conhecimentos adquiridos em um caso de conflito servem também para outros casos.

O objetivo não é simplesmente oferecer uma lista de impactos ou de riscos ambientais que afetam distintos grupos locais de população (camponeses, indígenas, quilombolas...) mas, além disso, ver tais populações como portadoras de direitos, que suas vozes sejam ouvidas (seus relatos orais, muitas vezes também com vídeos), vozes silenciadas pelas empresas, pelo Estado, pelos meios de comunicação, vozes que clamam por justiça social e ambiental.

Os inventários e mapas de injustiças ambientais são instrumentos de luta contra a injustiça e o racismo, tiram da invisibilidade a população cuja própria vida está ameaçada. O mapa, dizem os pesquisadores brasileiros, não é apenas uma tribuna, um alto-falante, mas serve também, de certa maneira, como um escudo protetor. Claro, na medida em que isso seja possível no contexto permeado de violência contra os mais pobres.


*Joan Martinez-Alier é economista ecológico professor da Universidade Autônoma de Barcelona.

Portaria pode paralisar definitivamente a identificação de Terras Indígenas


por Márcio Santilli
Do Instituto Socioambiental

Nesta semana, o Ministério de Justiça (MJ) fez circular entre os membros da Comissão Nacional de Política Indigenista (CNPI) uma minuta de portaria ministerial que acrescenta vários procedimentos administrativos ao processo de demarcação das terras indígenas, já regulado pelo decreto 1.775/96, ainda em vigor. A portaria, que deve ser publicada nos próximos dias, multiplica os ritos burocráticos e formaliza a intervenção de quaisquer interesses eventualmente contrariados desde a etapa inicial do processo, a de identificação das áreas de ocupação tradicional.

Essa fase inicial implica a constituição de grupo de trabalho, coordenado por um antropólogo com formação acadêmica reconhecida e integrado por outros técnicos – cartógrafo, biólogo, indigenista, agrônomo, conforme o caso – que identifica as referências de ocupação tradicional indígena, características ambientais e situação fundiária, além de formular uma proposta de limites a ser submetida às instâncias de decisão política – o MJ e a Presidência da República – para posterior demarcação física, homologação e registro cartorial. Esse grupo, de caráter eminentemente técnico, pode e deve produzir informações sobre interesses não indígenas incidentes na área em estudo, mas não lhe compete – e nem ele dispõe de legitimidade, poder administrativo ou proteção física – para rechaçar ou pactuar com terceiros interessados.

Segundo a minuta, o grupo “técnico” seguiria sendo coordenado por antropólogo, mas constituído agora por outros quatro membros, sendo um deles procurador federal da Advocacia-Geral da União (AGU) e os demais com formação em cartografia, topografia e meio ambiente. A proposta diz, ainda, que os integrantes do grupo devem ser prioritariamente funcionários públicos, podendo ser contratados em caráter privado sob condições. A especificação da formação técnica de cada um dos técnicos e, especialmente, a obrigatoriedade de inserção da AGU dificultarão ainda mais a criação e funcionamento de novos grupos de trabalho, que passarão a depender da duvidosa disponibilidade desses membros.

Ainda segundo a minuta, poderão participar das atividades do grupo representantes da comunidade indígena local, mas também dos municípios, dos estados e de nove ministérios, que deverão ser notificados pela Fundação Nacional do Índio (Funai) para indicar seus representantes em prazo determinado e cuja participação deve ser formalizada por portaria. Em suma, poderão participar do grupo até 20 integrantes, a maioria com interesses contraditórios em relação ao objeto do trabalho.

O que hoje ocorre é que a Funai encontra dificuldade crescente para recrutar até mesmo antropólogos para coordenar novos grupos de trabalho, pois é exíguo o número de profissionais do seu quadro e não tem sido possível contratar antropólogos vinculados às universidades ou a outros órgãos públicos, por caracterizar dupla remuneração. Não raro se vê antropólogos coordenando grupos de trabalho em caráter voluntário, sem remuneração (com direito apenas ao pagamento de despesas), e que, por isso mesmo, prestam serviço em períodos de férias ou quando têm disponibilidade, não podendo ser submetidos a prazos específicos para a entrega de relatórios e de outros produtos.

Nessas condições, tem sido cada vez mais difícil recrutar coordenadores e outros integrantes para os grupos de trabalho, assim como alocar, em cada caso, os antropólogos mais qualificados ou que tenham experiência, relações e informações acumuladas sobre o povo indígena e a região em questão. A nova portaria não se reporta a nenhuma dessas dificuldades objetivas, mas as multiplica, acrescentando responsabilidades de mediação de interesses contrariados que são estranhas à formação técnica dos profissionais requeridos e implicam em aumento exponencial de riscos pessoais, profissionais e políticos.

Além disso, vários dos procedimentos adicionais propostos na minuta implicariam em custos e despesas adicionais, mas o texto não provê solução para isso. Pelo contrário, explicita que a constituição de novos grupos de trabalho ficará subordinada “às disponibilidades orçamentárias”, que são exíguas e incertas, mas que certamente deveriam ser reforçadas caso pretenda-se melhorar a qualidade dos trabalhos de identificação de Terras Indígenas. Como o ritmo das identificações já tem sido lento, prolongando conflitos, é lícito supor que as dificuldades técnicas, burocráticas, políticas e orçamentárias que seriam acrescidas pela portaria poderão paralisar de vez esse processo.

Responsabilidade política

O ponto é que a responsabilidade de mediação política é do governo e, no caso, principalmente do ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, e a sua transferência para um grupo técnico, ou para a figura de um antropólogo, é uma completa aberração. Cardozo já tem suas gavetas abarrotadas de processos de demarcação, que aguardam decisão, por vezes, há anos. Tem sido incompetente para equacionar o pagamento de indenizações e para conduzir as negociações junto a proprietários rurais e ao governo do Mato Grosso do Sul, principal foco atual de conflitos envolvendo a demarcação de Terras Indígenas e chegou a ordenar a invasão de aldeias de índios Munduruku, no Pará, pela Força Nacional de Segurança, que matou um índio e feriu outros.

A edição da portaria aventada, ao final da sua gestão, seria uma consagração negativa definitiva. Se quisesse, o ministro poderia mirar-se no exemplo do seu colega, Pepe Vargas, ministro do Desenvolvimento Agrário, que editou uma portaria no início do ano, exigindo providências adicionais do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) para a instrução dos processos de desapropriação para a reforma agrária, mas teve que revogá-la no mês passado para não terminar o ano com nenhuma desapropriação, recorde histórico insuperável. Cardozo, que já vem nessa rota há três anos, ameaça concluir a era de omissões que protagonizou, deixando, como herança, um tiro no pé do próprio sucessor.

Terena: Ônibus escolar indígena é incendiado em Miranda

Ruy Sposati - Cimi)
O veículo estava estacionado na frente da casa do motorista, que presta depoimento à Polícia Civil na manhã de quinta. Segundo informações colhidas por lideranças de Cachoeirinha, o responsável pelo veículo acredita que o ônibus tenha sido intencionalmente incendiado com gasolina durante a madrugada.
"Ele [responsável pelo transporte] ligou pra mim e falou: 'eu não tenho problema com ninguém, não tenho concorrente. Por que alguém faria isso?'. E tem essas ameaças dos fazendeiros do dia 30. Então estamos muito preocupados com essa situação", explica o cacique da Cachoeirinha, Adilson Terena.
No início do mês, o vice-presidente da Acrissul, Jonatan Pereira Barbosa, anunciou publicamente durante uma audiência com senadores que "se no dia 30 de novembro nada for feito para dar segurança e paz à região, haverá derramamento de sangue”. Durante uma invasão de 150 fazendeiros à sede da Fundação Nacional do Índio (Funai), uma participante do protesto gritou a indígenas: "o dia 30 está chegando (...), e rogo uma praga a vocês: morram. Morram todos!"
"Dois anos atrás incendiaram um ônibus nosso com os alunos dentro", relembra o cacique. Em 4 de junho de 2011, um ônibus que transportava cerca de 30 estudantes Terena, a maioria entre 15 e 17 anos, foi atacado com pedras e coquetéis molotov. Seis pessoas, incluindo o motorista, sofreram queimaduras. Quatro foram internadas em estado grave. a estudante Lurdesvoni Pires, de 28 anos, faleceu, vítima de ferimentos causados pelas queimaduras. Na época, lideranças Terena creditaram o ataque a fazendeiros da região, no contexto da disputa pela demarcação das terras indígenas.
"Agora, os alunos estão com medo de ir para a escola. Diante do que já aconteceu, e diante dessas ameaças do dia 30, estamos muito preocupados. Esperamos que dessa vez isso tudo seja realmente investigado", conclui.